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sexta-feira, 13 de outubro de 2023

Fragmentação

Preciso esquecer você. 
Então, eu vou fragmentar momentos, lembranças, sentimentos e você, 
em pedaços pequenos que eu consiga perder. 
Talvez, só assim vou conseguir deitar e não me lembrar de você.

Quando penso em você, a angústia vem, bate em meu peito, dói e arde, 
minha mente vira uma tempestade, e meu coração seca de tanta saudade. 

Sentir essa dor me faz pensar se valeu a pena te conhecer. 
Não consigo dormir, me perguntando onde errei, 
faz-me pensar que preciso rapidamente fragmentar você. 

Vou colocar nossos momentos em uma caixa de concreto, 
jogar no mar e deixar afundar. 
Talvez assim eu consiga esquecer você. 

Você ter feito promessas que não iria cumprir 
é o mesmo que oferecer o mundo a alguém e não entregar uma simples cidade. 
É oferecer ser refúgio e não entregar um simples abraço. 
É prometer um simples amor e, no fim, entregar uma grande dor. 

Se foi tão simples pra você partir, da noite para o dia, 
por que está sendo tão difícil esquecer você?
Talvez seja pelo fato de que tudo me lembra você. 
Músicas. 
Filmes. 
Poemas clichês. 
Eu preciso muito esquecer você. 

Júlio Custódio

quinta-feira, 18 de março de 2021

Coração errante

O tempo passa e eu
vou perdendo a noção
Fico te olhando o tempo todo
sempre atenta, prestando atenção

Você parece incomodado comigo aqui
Mas eu não sei o porquê
Por mais incomodado que você pareça
ainda assim, tu olha pra mim
 
Seus olhos são ágeis
e registram cada momento
e minha mente e coração, devagar,
registrando todo o sentimento
 
Impaciente, descontente
você olha ao redor o tempo todo
mas a hora não passa
e ficamos encarando um ao outro
 
O que eu fiz de errado?
Por que você anda tão distante?
Será que meu coração errante
tem te deixado chateado?
 
Kaah Maxine

terça-feira, 14 de julho de 2020

Dentro da noite, dentro de mim

É à noite, enquanto a maioria dorme, que algo em mim desperta
Tantas coisas que pensei e queria compartilhar com o mundo
Das piores noites nasceram as coisas mais bonitas e mais tristes
Há tanta beleza na tristeza...
Acho que o inverso cria o verso...
Amores, ideias, medos, culpas, culpas, culpas...
Sempre tão juntos...
Sempre me molhando o rosto, me secando a alma... 
E paradoxalmente regando meu novo ser
Amores trazendo meus maiores medos
As culpas que assumi pra mim que nem eram minhas...
E novamente me culpo de novo por já ter me culpado
Os ideais, eu claramente sei que não fui eu que criei.
Vou responsabiliza-los por tudo...
A bebida foi a coisa mais útil, temporariamente mais útil pra fugir daqui
Mas quando voltava... Queria estar bêbada de novo...
De vez em quando me olhava no espelho e me perguntava: onde eu estava?
E agora estou aqui...
Um pouco mais lúcida, desfazendo ideais, desfazendo culpas, tentando me encontrar e me aceitar
Os medos... Não foi o pior de tudo...
Quantas pessoas sofrendo pelo mesmos motivos?
Um passo atrás do que aqui me encontro.
Lembrem-se: O inverso faz o verso
Dois lados de tudo
Fecho a porta, fecho a janela, fecho a boca e os ouvidos
Dentro de mim
Todos os meus encontros já vividos
Eu não posso me sufocar aqui dentro
Não posso me trancar...
Preciso me reescrever
O contato com o mundo me adoece e me cura
Escuto aquilo que me disse...
Lembra?
Como posso me achar só.
O que muda aqui dentro é sutil e ao mesmo tempo tão imenso...
Quem ou o quê encontrarei quando eu sair, não sei,
Mas se preparem para me encontrar...

Vanuza Alves

segunda-feira, 4 de maio de 2020

O ensino de música na educação bancária

Será a partir da situação presente, existencial, concreta, refletindo o conjunto de aspirações do povo, que poderemos organizar o conteúdo programático da educação ou da ação política. O que temos de fazer, na verdade, é propor ao povo, através de certas contradições básicas, sua situação existencial, concreta, presente como problema que, por sua vez, o desafia e, assim, lhe exige resposta, não só no nível intelectual, mas no nível da ação” (FREIRE, 2019, p. 119).
Na realidade prática das escolas privadas que, sobretudo hoje, atendem em grande parte a chamada classe média, é facilmente percebida a presença e suposta alta valorização do ensino de arte, principalmente, o da música. Não por esta ser uma linguagem artística de maior valor, ou por preferência específica daqueles que formulam a matriz curricular do colégio — ainda que isso possa de fato influenciar — mas sim por seu resultado comercial, que muito dialoga com a cadeia de indústria fonográfica hoje dominante. O educador musical que chega à sala de aula na esperança e anseio de, enfim, pôr em prática toda a bagagem teórica adquirida em três ou quatro anos de formação nos cursos de licenciatura da área, certamente sente-se rapidamente perdido e desanimado em sua atuação. Anos de estudo e suposto preparo para, agora, parecer que nada funciona? Que todas as “fórmulas” de sucesso metodológico em música não contemplam as reais necessidades da escola e, por consequência, de seus alunos? É provável que, em uma primeira leitura e reflexão sobre a situação, sejam essas as perguntas surgidas. Mas cabe novas questões que podem alterar todo o rumo de pensamento do educador nesse momento:

1. Quais são essas reais necessidades da escola com as aulas de música?
2. O que então esperam e precisam de fato os alunos de sua aula?

Respondidas essas duas, criticamente e com distanciamento, pode ser proveitoso se fazer mais estas questões: 

3. Essas necessidades da aula de música, apresentadas pela escola, tem qual objetivo? 
4. Como se sentem os alunos diante dos “caminhos” deste objetivo: animados? Desanimados? Curiosos? Cansados?

Se, ao se permitir tais perguntas, o educador chegar a uma conclusão geral de que o objetivo final da escola com suas aulas é uma apresentação, por exemplo, talvez haja um problema. Se os sentimentos envolvidos na pergunta de número 4 forem “desanimados”, “cansados”, como sugeridos, daí o problema é ainda maior.
A educação libertadora que se opõe à educação bancária, como proposto pelo educador Paulo Freire em seu livro Pedagogia do Oprimido (2019), abre nossa visão para o seio do problema real dessa angústia prática na educação musical. Quando Freire diz: “Será a partir da situação presente, existencial, concreta, refletindo o conjunto de aspirações do povo, que poderemos organizar o conteúdo programático da educação ou da ação política”, pode-se entender que qualquer projeto, tópico ou conteúdo abordado em aula deve surgir a partir das necessidades dos educandos, daqueles que de fato participam da aula, e não da necessidade institucional. Não é comum perceber um desencontro entre o anseio da turma para com a aula e os anseios institucionais da escola com esta mesma aula? Será que este desencontro não nasce justamente porque um não contempla o outro? E por que um não contempla o outro? Por que escola e alunos, que deveriam estar unidos num mesmo objetivo, se desencontram? Cabe aqui uma quinta e fundamental pergunta:

5. A quem ou ao que a escola serve?

Observe o dia a dia escolar. Suas reuniões pedagógicas — caso estas ocorram e os pedidos e questionamentos por parte da direção e/ou coordenação pedagógica: você percebe a citação recorrente de “pais”/“mães” como sujeitos nesses pedidos? Se sim, parece, ainda que de longe, que estes exercem algum domínio ou influência sobre os caminhos traçados pela escola? Muito provavelmente, diante de todo este cenário aqui exposto, tanto tais citações quanto sua influência são verdadeiras. E isso está diretamente ligado às suas aulas, caro(a) educador(a). Se pais e/ou mães são identificados como influenciadores nos caminhos que a escola traça, uma conclusão é evidente: a escola serve aos pais e/ou mães dos alunos, não a eles. E talvez esteja aí a falha geradora de toda a instituição. 
Pensemos nessa linha de “quem-serve-a-quem” dentro da escola, seguindo o raciocínio construído até então:

Fonte: o autor, 2020. 

A escola serve aos pais e/ou mães. Para que a escola possa atender aos pedidos dos pais e/ou mães, ela precisa de uma rede — pessoas — que a auxilie nessa conquista. Quem são essas pessoas? Quem forma essa rede que desenvolve diferentes atividades e ações que resultam em algo escolar — seja uma prova, uma feira, uma apresentação e etc? Só uma classe específica dessa rede me vem à mente: os professores. Seria lógico então, nesse raciocínio, considerar que os professores servem a escola, ampliando nossa rede:

Fonte: o autor, 2020. 

Nessa hierarquia os professores também necessitam de braços que possibilitem sua parte ser feita. Esses braços, como deve ser fácil a todos concluir, pertencem ao corpo discente, em outras palavras, aos alunos. 
Sendo o alunado uma massa técnica de indivíduos cujo objetivo escolar não ultrapassa a rasa função de cumprimento “estético-burocrático”, suas atividades pedagógicas em quaisquer disciplinas, inclusive nas linguagens artísticas, como música, se tornam superficiais e perdem a essência que está exatamente no desenvolvimento do pensamento crítico, analítico e reflexivo. O modelo de educação bancária, como propõe Freire (2019), nada mais permite aos estudantes do que tornarem-se depósitos de conteúdos previamente estabelecidos para eles. A educação musical, por sua vez, choca-se a esse propósito burguês no âmago de suas diretrizes que vem ganhando destaque de meados do século XX até hoje: realizar modelos de ensino artístico a partir dos saberes prévios do grupo a quem as aulas se destinam e a elas, consequentemente, tem todo o domínio dos caminhos que deve seguir. Uma vez que essa liberdade didática não lhes é dada, o ensino da arte perde sua potência singular de resistência ao modelo tradicional de ensino, tornando-se igualmente parte do mesmo sistema castrador e regulador das estruturas socioeconômicas — bem como de suas desigualdades consequentes — e quebrando possíveis expectativas nos educandos, que pouco ou nenhum valor enxergarão no fazer e educar artístico. 
A visão bancária da educação em nenhum momento entendeu o ensino de arte — seja qual for a linguagem — como processo intrínseco da educação integral e de direito universal de todo e qualquer indivíduo. Pelo contrário, a entende e manipula seus desdobramentos apenas com o intuito de manter os propósitos capitais que uma educação como produto defende. Como educadores, alinharmo-nos a essa lógica é tornar necrófila — tomando de empréstimo outro termo adotado por Freire (2019) — toda e qualquer justificativa que se possa dar para o incremento e ampliação do espaço e valorização do ensino de arte na educação básica. Se, de alguma forma, sua inserção nas escolas-banco não for minimamente subversiva à esta lógica, é possível que em pouco tempo não haja mais sequer a necessidade do showbussiness que ainda nos mantém, mesmo em tais condições, no espaço educacional privado.


Referências

FREIRE, Paulo. Pedagogia do Oprimido. 70 ed. São Paulo: Paz & Terra, 2019.



Junior Azuos

Educador musical e pianista, graduado no curso de Licenciatura Plena em Música do Centro Universitário Fiam-Faam. Atua como educador em escolas filantrópicas e da rede privada de educação infantil e ensino fundamental. 

Facebook: facebook.com/juniorazuosmusica
Instagram: instagram.com/juniorazuos

segunda-feira, 20 de abril de 2020

Entrelinhas #1 - A mulher dos pés descalços de Scholastique Mukasonga: um conto de fadas às avessas

Profª. Ma. Carolina dos Santos Rocha
Secretaria da Educação do Estado de São Paulo - Seduc/SP
E-mail: carolrocha83@yahoo.com.br

Fonte: Editora NOS

Em primeira pessoa, a narradora-personagem nos apresenta a mola propulsora deste livro: sua mãe, Stefania, uma mulher forte que busca incansavelmente pela sobrevivência de seus filhos e cujo único desejo era que seu corpo fosse coberto por suas filhas, pois segundo a tradição daquele povo, ninguém podia ver o corpo da mãe desnudo, apenas as filhas poderiam cobri-lo. No entanto, devido ao massacre de Ruanda, a autora não pode enterrar seus mortos, tão pouco cobri-los, mas oferece as palavras de seu romance como mortalha, uma homenagem a tantas mulheres ruandesas que perpetuaram a história de seu povo porque resistiram à violência.
O romance A mulher dos pés descalços narra o cotidiano de uma família ruandesa em situação de exílio devido ao conflito entre hutus e tutsis. Com uma linguagem fluída, a autora nos apresenta a cultura daquela região. Embora o relato do massacre entre hutus e tutsis tenha rendido até prêmios no cinema, aqui esse fato chocante não é protagonista. Parafraseando um verso de canção — permita que eu fale e não as minhas cicatrizes — nesse romance a voz é dada às histórias singulares de cada mulher e não às suas dores.
A narrativa sobre mulheres e a maneira como elas se organizam e protegem suas famílias nos conduzem enquanto leitores ocidentais a um mundo muito distante: um conto de fadas às avessas, pois não tem príncipe nem final feliz. No entanto, conhecemos a fada madrinha Suzanne, que iniciava as moças à vida sexual e assegurava-lhe que estava tudo bem. Há também a bruxa má Kilimadame, empreendedora, aprendeu a fazer pão, abriu um hotel e enfeitiçava os homens. E como uma matriosca, a narrativa se revela em diversos microcontos como, por exemplo, a história de Fortunata e sua doença do amor e de Cláudia, a órfã que não arranjava marido, mas com a ajuda das mulheres conseguiu se casar.
Vale ressaltar que muitas vezes no decorrer desses microcontos, a linguagem metafórica empregada pode suscitar uma discussão muito difundida na crítica literária: o imaginário e a importância de recontar o trauma. Alguns teóricos comentam a respeito do efeito terapêutico do narrar com o intuito de construir a realidade. Especificamente a respeito do relato do trauma, Gagnebin (2009) comenta a importância do narrador e do historiador na modernidade:
O que são esses elementos de sobra do discurso histórico? [...] aquilo que não tem nome, aqueles que não têm nome, o anônimo, aquilo que não deixa nenhum rastro, aquilo que foi tão bem apagado que mesmo a memória de sua existência não subsiste — aqueles que desapareceram tão por completo que ninguém lembra de seus nomes. Ou ainda: o narrador e o historiador deveriam transmitir o que a tradição, oficial ou dominante, justamente não recorda. Essa tarefa paradoxal consiste, então, na transmissão do inenarrável, numa fidelidade ao passado e aos mortos, mesmo — principalmente — quando não conhecemos nem seu nome nem seu sentido (GAGNEBIN, 2006, p.54, grifo nosso).
Cabe então a uma das filhas de Stefania, a narradora, transmitir o inenarrável em memória aos mortos e aos anônimos que constituem a sociedade matriarcal de Ruanda. Dessa maneira, durante a narrativa sobre aquela família, também conhecemos aspectos culturais importantes dos tutsis: o inzu, o sorgo, a medicina, o pão, os casamentos bem como os papéis sociais desempenhados por homens e mulheres, sobretudo, as mulheres. Sendo assim, o romance traz a história não oficial ou não dominante tão importante para, entre outras finalidades, a sobrevivência da memória de um povo contada por ele mesmo.
Quanto aos papéis sociais tão bem descritos na narrativa a respeito de homens e mulheres é possível destacar uma linha de pensamento filosófico adotada pelo ocidente e que tenta resgatar África ao seu povo em diáspora: trata-se do mulherisma africana ou africana womanism. 
Segundo Cleonora Hudson-Weems, a africana womanism é centrada na família, ela é forte em conjunto com os homens, “respeitando e reconhecendo espiritualmente seus pares masculinos, respeitando os mais velhos, sendo adaptável, ambiciosa, materna e nutridora”. E, em relação aos homens negros: “as mulheres negras não percebem os homens negros como inimigos, consideram como o inimigo as forças mais amplas e opressivas da sociedade que subjugam os homens, mulheres e crianças negras”. Assim observamos no trecho a seguir: 
As reuniões do ikigo constituíram o verdadeiro parlamento das mulheres. Os homens, por sua vez, cuidavam da justiça e dos negócios de fora da comunidade; [...] As mulheres eram responsáveis pela educação, saúde, economia e assuntos matrimoniais...Cada um tinha direito de falar, pelo tempo que quisesse, sem ninguém interromper. Não havia maioria, não havia minoria. As decisões eram tomadas quando todos consentiam. (MUKASONGA, 2017, p.136). 
Ao contar sua própria história, o romance traz à tona um sentimento de identidade racial no que diz respeito ao nosso passado colonial porque em diversos trechos apresenta-se a cultura do colonizador branco em oposição à cultura local, como por exemplo, o uso de calcinhas, as religiões, os remédios. Era considerado civilizado aquele que adotava os costumes brancos e, somente as crianças batizadas tinham acesso à educação. 
Scholastique Mukasonga expõe em seu romance de maneira atenta e crítica sobre a importância da educação formal para as mulheres tutsis. A narradora descreve o ato subversivo de sua mãe, Stefania. Ela não se conforma em ver uma menina privada do direito de ir à escola, e rapidamente, por meio de uma delegação de mulheres convence o professor Bukuba a alfabetizar a criança, colocando Gloriosa — nome de batismo — na escola. 
Assim, A mulher dos pés descalços não é um relato, mas uma resposta crítica da subalternidade para o poder instituído pela força. Stefania, por meio de suas estratégias de sobrevivência e sua agência em reunir mulheres em assembleia e decidir questões importantes para sua comunidade transmite um ato revolucionário e esperançoso para quem está aberto a outros paradigmas. 

Referências

GAGNEBIN, Jeanne Marie. Lembrar escrever esquecer. São Paulo: Editora 34, 2009. 

HUDSON-WEEMS, Cleonora. Africana Womanism – O outro lado da moeda. Trad. Naiana Sundjata. 2012. Disponível em: https://quilombouniapp.wordpress.com/2012/03/22/africana-womanism-o-outro-lado-da-moeda/. Acesso em: 20 mar. 2020. 

MUKASONGA, Scholastique. A mulher de pés descalços. Trad. Marília Garcia. São Paulo: Nós, 2017.


Mestra pelo Programa de Estudos Pós-Graduados em Literatura e Crítica Literária da Pontifícia Universidade Católica de São Paulo - PUC-SP. Possui graduação em Letras pela Faculdade de Filosofia, Letras, Ciências Humanas da Universidade de São Paulo - FFLCH/USP. Atualmente é Professora de Educação Básica II na Secretaria da Educação do Estado de São Paulo - Seduc/SP. Tem experiência na área de Letras, com ênfase em Literatura Brasileira. Idealizadora do clube de leitura Café Preto (Currículo Lattes). Café Preto - Facebook / Instagram





sexta-feira, 10 de abril de 2020

O fim dos Beatles

It was fifty years ago today




Há exatos 50 anos, no dia 10 de abril de 1970, Paul McCartney anunciava durante uma entrevista o fim da maior banda de todos os tempos. Após aproximadamente 10 anos de uma história musical que estava em constante ascensão e crescimento monumental, os Beatles iriam se separar de uma vez por todas. 
Muitos foram os motivos que levaram às brigas e dissolução da banda, dentre os quais destacam-se a rivalidade e constantes desentendimentos entre os membros, principalmente entre John Lennon e Paul McCartney; o desânimo do guitarrista George Harrison por ter suas composições e contribuições constantemente descartadas; o baterista Ringo Starr que não se sentia valorizado pelos demais colegas; o relacionamento entre John e Yoko que desequilibrava a harmonia no trabalho em estúdio e as inúmeras dívidas e empreendimentos malsucedidos que faziam com que a banda perdesse quantidades absurdas de dinheiro. 
Mas será que a história do triste fim da maior banda que já existiu pode nos ensinar alguma coisa hoje, mesmo após 50 anos? 
A história dos Beatles é um exemplo de que, quando queremos e estamos dispostos a melhorar, nós entramos em uma constante evolução em todos os âmbitos de nossa vida. Ao ouvirmos o primeiro álbum, Please Please Me de 1963, não dizemos que é a mesma banda que está no álbum Sargent Peppers Lonely Hearts Club Band de 1967, oitavo disco de estúdio. 
É extraordinário acompanhar os primórdios da história dos 4 meninos de Liverpool, que começaram com músicas simples (porém excepcionais) de garotos apaixonados, como She Loves You por exemplo, e passaram por um amadurecimento musical que acabou por influenciar todas as gerações de músicos até os nossos dias, com letras e arranjos complexos, que apresentam uma genialidade e originalidade únicas na história da música. 
O fim do Fab Four nos mostra que, por mais que algumas fases em nossa vida sejam extraordinárias, marcadas por experiências e realizações que não gostaríamos que acabassem, nós crescemos, evoluímos, e com isso os ciclos se encerram e tomamos caminhos diferentes. Às vezes, é melhor encerrar um ciclo no momento certo, para que tudo que foi vivido até aquele momento seja uma saudosa lembrança de dias bons, de alegrias e aprendizados, porém na certeza de que devemos caminhar sempre adiante. Pois, quando menos esperamos, nossas histórias podem mudar e tomar rumos completamente diferentes após um simples ato de atravessar a faixa de pedestres. E depois, nos resta apenas seguir em frente e “Let it be”
Que possamos viver nossa vida do mesmo modo como apreciamos um disco dos Beatles: repleto de beleza; de melodias alegres, tristes e esperançosas; de momentos maravilhosos, sabendo que mesmo após o disco ter tocado a sua última faixa tudo terá valido a pena. 

“And in the end, the love you take is equal to the love you make.” 
(Lennon/ McCartney)

Diego Rocha 

Diego de Souza Rocha é um publicitário paulista de 29 anos. Amante da arte, da filosofia, da poesia, da literatura, da música, da natureza e de toda a beleza que a vida pode proporcionar.

domingo, 29 de março de 2020

Por trás das cenas #1 - American Son

Profª. Ma. Carolina dos Santos Rocha
Secretaria da Educação do Estado de São Paulo - Seduc/SP
E-mail: carolrocha83@yahoo.com.br

American Son – Netflix – 2019

Fonte: Netflix

Filme produzido pela Netflix, sob direção de Kenny Leon, narra o conflito racial entre uma mulher negra, Kendra, e a polícia. A mãe tenta saber a localização do filho Jamal que saiu de carro durante à noite e não retornara. Kendra, doutora em Psicologia e professora universitária, fora casada com Scott, um homem branco, agente do FBI. Jamal é miscigenado e passa por um “despertar” racial segundo afirma a mãe do personagem: tem cabelo trançado, usa roupas de um estilo de rua e adesivou o carro com os dizeres “Dispare em policiais”, uma mensagem subliminar de autodefesa que instrui meninos negros a tirarem fotos de ações policiais.
O filme, baseado em uma peça da Broadway, é ambientado em único espaço — a sala de espera de uma delegacia — e, há poucos personagens em cena que, em geral, aparecem em duplas em longos diálogos.
O primeiro diálogo acontece entre Kendra e o policial Paul. Desesperada, a mãe quer registrar o desaparecimento do filho e, o policial tenta a busca por uma ocorrência policial. Por diversas vezes, Kendra reafirma, por meio de uma descrição humanista, que seu filho não tem antecedentes criminais. Ela destaca as preferências de Jamal, mas não é isso que o policial busca. O agente da lei procura por nome “de guerra” ou a marca de alguma cicatriz provocada por briga.
Depois Kendra discute com Scott, pai de Jamal. Ela o repreende por sua linguagem de “gueto” e nota que em poucos minutos o policial passou as informações a ele, homem e branco. O ex-casal discute sobre suas diferenças raciais e sobre como o filho se sente “a cara da raça” na escola particular que o matricularam. A despeito destas diferenças, ambos acreditaram em uma educação de qualidade que colocaria Jamal a salvo de uma sociedade outrora segregada. Doutora em Psicologia, Kendra não ficou a salvo da discriminação racial, mas acreditou, conforme acusa o tenente Stokes, em um sonho americano.
Um “sonho americano” foi o que Scott tentou oferecer ao filho Jamal. Em um terceiro momento, O ex-marido branco discute com Kendra, seu discurso a deslegitima enquanto mulher, mãe e negra ao defender que as questões raciais não devem ser expostas, pois traz um desconforto aos brancos. Pra ele, Jamal não deve trançar cabelo e nem falar feito um “mano de rua”: — "Ele faz parte do meu mundo, não do seu", diz Scott a Kendra. Ao ser confrontado seja pelas circunstâncias, seja pela ex esposa, Scott é obrigado a enfrentar as diferenças raciais presentes entre ele e o filho Jamal. 
A maternidade negra é discutida em cena. Kendra não dorme, como a maioria das mães, no entanto, ela tem preocupações exclusivas: o filho é maior de idade e decide viajar para o sul do país com outros amigos. Segundo bell hooks, em sua obra Olhares negros, raça e representação, “viajar” é o espaço da branquitude: “[...] viajar é se deparar com a força aterrorizante da supremacia branca”. Kendra se aterroriza pelo futuro do filho porque sabe que o sul de seu país carrega uma marca segregacionista. 
A cena descrita por Kendra — o filho negro se interessa por uma moça branca na lanchonete e outro rapaz branco o ataca por isso — põe em debate um fato bastante comum no passado: os linchamentos de homens negros suspeitos de estupro. A imagem do homem negro enquanto estuprador em potencial foi forjada pós Guerra Civil, conforme afirma Angela Davis, em Mulheres, raça e classe: “A instituição do linchamento, por sua vez, tornou- se um elemento de terror racista do pós guerra” (p.189). Logo, o medo de Kendra se justifica em um passado histórico americano que pressupunha a culpa do homem negro. Desde que o filho nasce, as noites de sono das mães não são as mesmas — afirma o senso comum — no entanto, as preocupações das mães negras são singulares, pois se baseiam no racismo construído primeiramente com a escravização e, depois, com a segregação instituída pelas leis Jim Crow que não permitiram, por exemplo, as relações afetivas inter-raciais.
Dessa maneira, American Son é um filme que retrata os conflitos raciais tão literalmente que torna, infelizmente, óbvio seu desfecho trágico. Embora algumas diferenças históricas possam distanciar a análise de tais conflitos no contexto brasileiro, esta produção Netflix pode ser bastante didática em suscitar um debate saudável culminando no ensino afirmativo das culturas de identidade negra.


Mestra pelo Programa de Estudos Pós-Graduados em Literatura e Crítica Literária da Pontifícia Universidade Católica de São Paulo - PUC-SP. Possui graduação em Letras pela Faculdade de Filosofia, Letras, Ciências Humanas da Universidade de São Paulo - FFLCH/USP. Atualmente é Professora de Educação Básica II na Secretaria da Educação do Estado de São Paulo - Seduc/SP. Tem experiência na área de Letras, com ênfase em Literatura Brasileira. Idealizadora do clube de leitura Café Preto (Currículo Lattes). Café Preto - Facebook / Instagram 

quarta-feira, 27 de novembro de 2019

Quebrando correntes

A escravidão não acabou
só mudou de nome, 
agregou correntes e filiou-se a partidos. 

Agora ela se chama emprego, trabalho

— só que agora remunerado. 
Sem correntes ou capitão do mato para nos caçar.

Chicotes que rasgavam 

a pele dos nossos antepassados 
foram passados de mão em mão, 
o que no século 21 é bem mais conhecido como palavrão
vindo da boca daquele o qual você chama de "patrão" [risos — pura ilusão]

Tentando entender por quê? Pra quê? 

E até onde eles pensam que vão
levando adiante esse tipo de humilhação?!

Esquecendo que dependem

da mão de obra daquele o qual exploram e agridem verbalmente
para em sua mesa por o pão, 
para que supra sua ostentação.

Somos mais fortes do que se pensa 

e não e só força de expressão! 

Quebrando correntes atuais com palavras 

sem mais precisar calejar as palmas das mãos!

Warquis S. Guedes

quinta-feira, 31 de outubro de 2019

Amor

Eventualmente,
alguém vem me salvar.
Acontece um dia ou outro,
às vezes uma vez no mês.
É sempre no meio da noite,
as lágrimas tomam conta de meus olhos e
assim sei que está perto.

Eventualmente,
te encontro.
Talvez,
uma ou duas da manhã.
Meu corpo começa a soar e meu coração acelera.
É assim que te reconheço.

Mas, eventualmente,
você some.
São noites solitárias sem sonhos,
sem você e sua imagem.

Ainda me lembro da última vez que sonhei contigo,
estava vestido com uma polo salmão
e aqueles malditos jeans que nunca abandonou.
Estava lindo, encantador.

Seu nome era amor.

Emillye Freitas

sábado, 21 de setembro de 2019

Viajantes etéreos

Sou mais uma alma vagando a noite por SP.
Sou mais uma alma, uma entre milhares de almas vazias.
Sou mais uma alma a espera de que alguém que amo volte.
Somos almas vagando a noite por SP.
Somos almas andando sem rumo e chorando amargura.
Somos almas desejando algo que amamos voltar.
Sou apenas mais uma alma fria e sem vida vagando a noite por SP.
Entre avenidas e becos frios, entre luzes de faróis e postes,
existem corações a espera de um amor impossível, existem mentes que pensam e não produzem.
Somos pessoas que sonham com um futuro brilhante.
Somos apenas almas vagando a noite por esta grande cidade...
Somos apenas almas vagando por SP.

Annie Stephanie

sábado, 6 de julho de 2019

Cotidiano

No cotidiano, o gosto do café e da comida requentada me incomoda. 
No cotidiano, as olheiras e manchas que crescem durante a semana me atordoam. 
No cotidiano, abuso de coca diet, café, cigarros, drogas lícitas, para não surtar. 
No cotidiano, engulo fel, sangue e ranho tentando me acalmar. 
No cotidiano, sinto que minha alma fugiu desse corpo, pois não há emoções, nem grandes eventos acontecendo ao redor desta capa. 
Superestimando pra caralho, absorvendo os fatos de menos. 
Fantasiando com as mesmas capas... 
É assim que estou vivendo. 

Simone Roza

sábado, 13 de abril de 2019

Catarina

Catarina andava pela Conceição, prestava atenção em cada monumento e sentia sua vibração. A árvore da saída do metrô sempre chamara sua atenção. Observava a cidade pelas margens da sociedade. Quando de repente um mendigo parou-a. Disse que estava com fome, com sono e com frio, que a vida não era a mesma desde que entrara na Capital. A garoa sempre o pegava, o que o deixava doente. A fome doía constantemente e dormir em cobertores rasgados e fedidos sempre o fazia chorar a noite. Ele disse que sempre quis ter uma banda e que era músico. Tocava violão desde os 3 anos de idade, mas o vício tirou tudo dele. Inclusive seus sonhos. O mendigo contou sobre sua família. O pai não era presente, pagava uma pensão de 100 reais com medo de ser preso. A mãe era muito controlada e possessiva e quando descobriu que ele estava começando a usar cocaína, o trancou com correntes em casa. Não ajudou muito. Ele sempre sabia onde estava a chave. E no final, ele sempre vendia mais um móvel dela, o importante era estar alucinado, quem se importava com os vidros quebrados? Ele tinha uma irmã, ela morreu espancada por um traficante. O mesmo traficante que fornecia cocaína para ele. Ser morador de rua era viver todo dia como se fosse o último, e ele havia encontrado um refúgio. O metrô. 
Catarina perguntou-lhe se ele já havia se apaixonado por alguém. E essa pergunta o deixou pensativo. Ele olhou ao redor e depois de um tempo, soltou palavras confusas. Estava distante. 
"Nunca me apaixonei por uma pessoa, mas me lembro de quando era apaixonado pela vida. Lembro de quando acordava cedo na minha casa, tinha sempre algo para comer na mesa, uma coberta macia e uma cama..." 
Catarina disse que precisava ir embora. Estava se sentindo mal. Foi em direção à estação. 
No dia seguinte, o metrô parou. A notícia era de que uma mulher havia se jogado nos trilhos ao anoitecer.
O mendigo estava perturbado. O metrô estava agitado. Pessoas atrás de pessoas correndo.
Ele ouviu boatos de que uma senhora havia se suicidado. Uma senhora?
CATARINA
não pode ser... ou podia?

Victória Suellen

sexta-feira, 22 de fevereiro de 2019

Ensaios poéticos

Na manhã de primavera
Estava na janela
Lendo um lindo livro amarelo
Quando de repente passou
Um pássaro azul
E com um lindo canto me fez refletir
Gosto de viajar, ouvindo uma música suave para melhor descansar.

Vejo uma moça bonita
Vestida com um blazer bege, meio dourado e de camisa branca
Brincos dourados, com faixa cinza na cabeça
E um lenço amarelo com as beiradas arrendadas.
E a moça com os olhos arregalados
Parece estar fazendo pose para ser fotografada

Vera Lucia

sábado, 17 de novembro de 2018

Consciência negra: não é apenas um dia, mas um chamado à reflexão, os professores podem contribuir

Prof. Dr. Márcio Jean Fialho de Sousa
Universidade de Montes Claros - UNIMONTES
E-mail: pcopmarciojean@gmail.com

O Dia da Consciência Negra é uma data bastante importante para refletir especificamente sobre a importância dos negros para a constituição da cultura nacional e, acrescento ainda, é um momento para homenagear todos àqueles que sacrificaram e renderam suas vidas por esta terra chamada Brasil.
Diante disso, vale pensar sobre os preconceitos e racismos que, ainda hoje, a comunidade negra tem sofrido no seu cotidiano. Muitas vezes esse sofrimento nem chega a ser resultado de agressões físicas, o que não deixa de acontecer também, mas vêm de onde não se espera, e de pessoas que, muitas vezes, também nem se dão conta de que seu discurso pode estar à serviço da propagação de preconceitos e racismos resultantes de uma história que teve início há muitos séculos antes.
Na escola, por exemplo, o papel do professor é de extrema importância para que o respeito às diferenças possa ser propagado. Esse cuidado pedagógico, porém, deve estar sempre preocupado com parâmetros que valorizem o ser humano por ser humano e não por pertencer a esta ou aquela etnia, raça, gênero, nação ou língua. Desse modo, o discurso educacional empregado nas salas de aula, pelos professores, é responsável por grande parte da formação das crianças em sua fase de formação cognitiva. Isso ocorre porque o professor, na escola, é o modelo de adulto que a criança tem referência, e nele se espelhará muitas vezes. Por isso, a responsabilidade do professor de educação infantil e das séries iniciais, por exemplo, é decisiva para toda a carreira acadêmica da criança e para a formação da sua cidadania — claro que os pais têm maior responsabilidade nesse processo, porém não é possível ignorar a ação dos professores nesse ínterim. 
Desse modo, urge que se faça um debate acerca dos discursos educacionais como formadores de conceitos. Para isso, lançarei mão de dois textos literários, a saber “A menina Vitória”, de 1965, escrito pelo angolano Arnaldo Santos, e “A menina do lápis de cor”, de Silvana Martins, escritora afro-brasileira, para ilustrar como a educação pode ser propagadora de valores que elevem o ser humano à sua verdadeira dignidade e como, ao mesmo tempo, pode ser propagadora de valores que excluem o negro da sociedade, vendo-o como inferior. 
Os estudos africanos e afro-brasileiros têm ganhado espaço nos diversos meios educacionais de modo progressivo. Esse fato deve-se, em grande parte, às leis 10.639, de 2003, e a 11.645, de 2008, que regulamentam e obrigam o ensino básico da educação nacional a incluir no currículo oficial da rede a temática da “História e Cultura Afro-Brasileira e Indígena”. 
A lei de 2003, em seu inciso 2º, dispõe que os conteúdos referentes à História e Cultura Afro-Brasileira devem ser ministrados no âmbito de todo o currículo escolar, “em especial nas áreas de Educação Artística e de Literatura e História Brasileiras” — o mesmo é dito no inciso 2 da lei 11.645. Deste modo, sendo a Literatura a expressão de um povo, ao mesmo tempo em que nasce de determinado povo, dando voz aos aspectos de sua identidade, de seus valores e crenças, é lícito que os professores deem voz ao povo que foi silenciado por séculos a fio, mas que ao mesmo tempo, de modo diferente ao realizado pelos europeus que aqui chegaram e se instalaram, foram também responsáveis pela formação da nação brasileira, passando desde a formação do português brasileiro, até às tradições, culinária e o jeito brasileiro de ser.
Ocorre que essas leis são apenas os primeiros passos para uma mudança profunda nas estruturas educacionais, e essa transformação não ocorrerá de uma hora para outra, será necessário ainda percorrer um grande caminho para a mudança de toda uma estrutura cultural que há séculos vinha sendo propagada, vivenciada e perpetuada na e pela história. 
Segundo Ruth Amossy, a construção de um discurso e sua aceitação se desenvolvem por meio de estereotipagem, ou seja, o destinatário do discurso avalia a mensagem veiculada a partir de um modelo pré-construído dentro de categorias por ele difundida e no interior da qual ele a classifica. Em outras palavras, o público não avalia apenas o discurso, mas o lugar do qual ele é produzido (AMOSSY, 2005, p. 125-126). Sendo assim, se o produtor do discurso é um professor, socialmente, seu posicionamento estereotípico é de autoridade, por isso tem grande peso e importância o que ele diz. Daí a autoridade, a validação e o compromisso do discurso do profissional da educação. 
Nesse sentido, estão de acordo Kabengele Munanga e Maria Antonieta Alba Celani ao afirmarem que a constituição da identidade de um indivíduo e de um povo se dá por meio da linguagem. Para Munanga, a linguagem é também uma das manifestações mais próprias de uma cultura, pois longe de ser apenas um veículo de comunicação objetiva, é testemunho das experiências adquiridas por um povo, compõe sua memória coletiva e seus valores (MUNANGA, 2005-2006, p. 48). Celani, por sua vez, endossa essa perspectiva na medida em que afirma ser a linguagem uma ferramenta psicológica, necessária para o estabelecimento das práticas sociais, e é nessas práticas que o indivíduo se constitui como ser humano (CELANI, 2005, p. 43). É nessa perspectiva que será analisado o discurso educacional presente nas narrativas selecionadas para este estudo, elencadas no início desta comunicação.
Os contos “A menina Vitória”, de 1965, do angolano Arnaldo Santos, e “A menina do lápis de cor”, de 2015, da escritora afro-brasileira Silvana Martins, apresentam narrativas ficcionais de formação que exemplificam situações que representam a realidade nas escolas quanto ao poder do discurso pedagógico, recorrentes em sala de aula, e que precisariam ser repensadas pelos profissionais da educação com o intuito de promover o respeito e a convivência com a diferença. 
No texto de Arnaldo Santos é apresentada a história de uma menina negra que ascende socialmente ao se tornar professora, ficando conhecida como a menina Vitória, professora da 3ª classe.
[Ela] era uma mulatinha fresca e muito empoada, que tinha tirado o curso na Metrópole. Renovava o pó-de-arroz nas faces sempre que tivesse um momento livre, e durante as aulas gostava de mergulhar os dedos nos cabelos alourados e sedosos de uns meninos que se sentavam nas primeiras filas (SANTOS, 1985, p. 83).
Vale notar que este conto foi escrito no período em que Angola ainda era colônia portuguesa, visto que a independência do país se deu, oficialmente, no dia 11 de novembro de 1975 e o texto é de 1965. Fato importante a ser notado, pois isso implica dizer que saber que a menina Vitória é uma negra que teve acesso à educação formal e, além disso, ter estudado na Metrópole, unido ao esforço de se parecer branca, sempre renovando o pó-de-arroz, e a preferência pelos alunos com fenótipos europeus a coloca no lugar de uma assimilada. 
Essa categorização do termo assimilado foi designada pelo governo português, no ano de 1926, atualizada em 1929, e reforçada no Acto Colonial, promulgado em 1930. Segundo consta, e a critério do governo, o assimilado 
[...] tinha de ter 18 anos de idade, demonstrar que sabia ler, escrever e falar português fluentemente, ser trabalhador assalariado, comer, vestir e ter a mesma religião que os portugueses, manter um padrão de vida e de costumes semelhante ao estilo de vida europeu e não ter cadastro na polícia (ZAU, 2015). 
Os que não se encaixassem nessa descrição eram designados indígenas. Deste modo, ainda que negra, a menina Vitória sentia-se branca e agia como uma europeia, inclusive humilhando e rebaixando seu povo, como se tivesse esse direito e como se não pertencesse a ele. Ao receber o novo aluno Gigi, que tinha uma pronúncia ruim do português, mas que consegue acessar a escola por meio do muito esforço feito pelo pai que queria vê-lo secretário, a professora olha-o com desconfiança e o coloca no fundo da sala junto a outra criança negra, chamado Matoso e que se tornara adjetivo, na boca da professora, para determinar tudo o que fosse ruim e desprezível na sala de aula: “ ‘Pareces o Matoso a falar...’, ‘Sujas a bata como o Matoso...’, ‘Cheiras a Matoso...’ – e ele [o Matoso] guardava-se cada vez mais à carteira, transido por aqueles comentários impiedosos” (SANTOS, 1985, p. 83) da professora, tudo isso porque, além dela tê-lo recebido mal, desde a primeira aula, “não escondera a sua má impressão, com alusões veladas à sua bata de brim grosso” (SANTOS, 1985, p. 83). O relacionamento da professora piorou ainda mais quando, certa vez, Matoso a respondeu em quimbundo dizendo “O quê, julgas que eu sou da tua laia...!?” (SANTOS, 1985, p. 83). 
Desse modo, a afronta à professora assimilada seria excessiva, afinal, além de não se reconhecer entre os seus, ela ainda teria sido insultada em uma língua destinada aos indígenas, classe subalterna, colonizada e pobre. Porém, deixando de assumir seu papel de educadora, afinal estava apenas para promover a manutenção do status quo, o que fazia ela era ir jogando pela sala o nome do aluno com crueza, “criando um símbolo maldito” a partir da figura da criança.
Mediante a indiferença da professora, Matoso acaba por exteriorizar sua real cultura, seus valores, ao utilizar o quimbundo dirigindo-se a ela. Desse modo, assim como dito por Munanga, a língua representou naquele ato o testemunho de suas experiências, de seu povo (MUNANGA, 2005-2006), logo, mais que o significado das palavras proferidas, o que mais afrontou a menina Vitória foi a língua utilizada, pois esta demarcou a identidade daquele povo, a qual ela também estava inserida e que, de certa forma, fazia parte de sua essência, mas que foi rejeitada por ela.
Por outro lado, sendo a professora a autoridade reconhecida socialmente naquele espaço, restaria ao aluno o recolhimento e a insatisfação por fazer parte daquele lugar. Outros alunos, vendo a situação, acabavam por se retraírem também, limitando sua participação nas aulas o quanto podiam. Gigi, por exemplo, retraiu-se: 
Olhava para os colegas de soslaio, inseguro. [...] não respondia quando a menina Vitória o chamava à lição, receando o despropósito que o identificasse com o Matoso. [...] diminuía-se ainda mais para não ser notado, esforçando-se num mimetismo impotente por imitar gestos dos meninos da baixa, [e dizia] Tenho que ser como eles (SANTOS, 1985, p. 83). 
Em “A menina Vitória”, o aluno Gigi acaba se limitando cada vez mais no seu desenvolvimento cognitivo, resultado do medo provocado pelas risadas dos colegas diante das correções grosseiras feitas pela professora, sendo assim, “Esvaziava-se das pequeninas realidades insignificantes que ele vivia, das suas emocionantes experiências de menino livre, agora proibidas e imprestáveis” (SANTOS, 1985, p. 84), apenas em casa externava toda a sua insatisfação e insultava com muita fúria a professora. Matoso, com o passar do tempo, já não se debatia, nem chorava, “Apenas no rosto as suas feições endureciam sob a pressão dos maxilares contraídos. Exasperava-a” (SANTOS, 1985, p. 84).
O texto de Arnaldo Santos é capaz de levar o leitor à realidade do contexto da escrita. Por meio de Gigi e de Matoso é possível perceber o sofrimento de um povo oprimido e explorado, tendo como seus maiores algozes não propriamente os colonos portugueses, mas os próprios colonizados trabalhando para a estabelecimento dos poderes aos quais também eles estavam subjugados, tendo, neste caso, o discurso da professora como chancela para a permanência da discriminação e rebaixamento da maioria.
No texto de Silvana Martins, por seu turno, publicado cinco décadas depois, a violência é aparentemente menor que a apresentada por Arnaldo Santos, porém simbolicamente perpetua, de modo camuflado e sutil, os mesmos valores racistas presentes em “A menina Vitória”.
Em “A menina e o lápis de cor”, Silvana Martins retrata o conflito vivido por uma criança negra que mediante a tarefa de desenhar sua família se dá conta de que o lápis “cor de pele” não condiz com a cor de seus familiares, o que traz à discussão o valor dos discursos presentes em termos e referências escolares aparentemente despretensiosas e sem valor ideológico. 
“A menina e o lápis de cor” narra uma situação vivida por uma criança ainda no período da alfabetização: “Ela ainda estava aprendendo as primeiras letras”, informa a primeira linha do conto. Nesse período a criança adorava ir à escola e aprender coisas novas. Era um momento de grandes descobertas que ela levaria para a vida toda. Certo dia, a professora propôs que cada um desenhasse sua própria família. A menina toda contente e satisfeita desenhou toda a família por ordem de altura: o pai, o irmão, a irmã, a mãe e ela. O grande dilema, porém, apareceu no momento em que ia começar a colorir. Foi então que ela perguntou:
— Professora, que cor eu uso para pintar minha família?A professora se aproximou com cuidado, parecia que as palavras ficaram dentro dela. Ela pensou muito e me disse: “Use o cor de pele para pintar sua mãe e você e o marrom ou preto para pintar os outros”.
— Mas professora, esse cor de pele é rosado, e o preto é muito escuro, eu nunca vi gente dessas cores. A senhora já viu?A professora balançou a cabeça e sorriu. Disse docemente:
— Eu nunca vi (MARTINS, 2015, p. 175).
De fato, esta cena é, ou já foi, bastante corriqueira nas escolas, porém, por traz da doçura da professora, ainda que ela não endossasse diretamente a ideia pressuposta, há naquela frase uma classificação racial e preconceituosa de que a cor da pele deve ser aquela cor clara, cuja proximidade estaria na cor rosada, tal como o estereótipo europeu e norte-americano. O problema gerado na discussão, no entanto, não foi resolvido. A criança teve que levar a questão para casa:
— Mamãe, tenho um problema...
— Qual, querida?
— Como faço para pintar minha família, se cada um aqui em casa tem uma cor?Minha mãe sorriu e disse:
— Teremos que comprar uma caixa de lápis com mais cores, que tenha vários tons de marrom.No caminho para casa eu lhe perguntei por que cada pessoa tem uma cor, e minha mãe me explicou, do jeito dela, que papai do céu fez as pessoas assim para que elas pudessem entender que são as diferenças que tornam cada ser especial. (MARTINS, 2015, p. 176).
Diferentemente da história de Gigi, a menina do lápis de cor teve como contar com a ajuda da mãe que prontamente e com simplicidade, e como a educadora primeira, ensinou à filha que as diferenças existem e sempre existirão, e que cada pessoa se torna especial por suas especificidades, tarefa com que a professora poderia ter contribuído. 
Chegando à escola a menina mostrou o cartaz à professora:
— Pronto, professora, agora como eu escrevo os nomes?Ela pegou meu cartaz e sorriu.
— Sua família é colorida assim?
— Sim, temos negros de todos os tons lá em casa.
— E você, de que cor você é?
— Eu sou negra, professora, como todos os outros lá de casa. (MARTINS, 2015, p. 176).
Como se pode notar, o discurso racista embutido no lápis de cor “de pele” não foi o suficiente para rebaixar e/ou promover maiores problemas para o desenvolvimento cognitivo da menina questionadora, pelo contrário, justamente por características próprias, a inquietação da aluna fez com que ela fosse a procura de respostas com outra pessoa imbuída de autoridade, neste caso, a mãe. 
Dessa forma, a linguagem foi efetiva e afirmativamente empregada para o estabelecimento das convivências sociais, de modo que a criança pode, nesse processo, reconhecer-se como indivíduo distinto, assim como todos os outros o são, mas de modo algum inferiorizada como ser humano, tal como já refletira Maria Antonieta Alba Celani ao discursar sobre o papel da linguagem na constituição do sujeito (CELANI, 2005, p. 43). Pelo contrário, “a identidade do indivíduo vai se constituindo pelo contato com o outro e por meio de uma troca contínua que permite a ele estruturar-se e definir-se pela comparação e pela diferença em um processo de reconhecimento”, acrescenta Alcione Carvalho (2012, p. 88).

Considerações finais

Tentando esboçar algumas considerações finais, vale lembrar que a história da cultura e da valorização do negro no Brasil aos poucos tem ganhado espaço significativo, particularmente, desde o ano de 1933, quando Gilberto Freyre publica a obra Casa-grande & senzala. Sem, no entanto, ter a pretensão de analisar essa obra neste curto espaço que cabe este estudo, essa obra de Gilberto Freyre, de certo modo, foi a responsável por mostrar uma vida real e verdadeiramente humana dos negros, e não distinta das dos outros brasileiros, aqueles que ainda os ignoravam. Claro que muitas questões já foram levantadas sobre a obra, mas não vêm ao caso, o que vale aqui é a ressignificação do negro que a obra propôs. 
Depois dessa divulgação promovida por Freyre, a década de 1970 é a que apresentou novos movimentos sobre as questões étnicas e raciais no Brasil: “Movimentos sociais e a permanência da comunidade negra em revelar o abismo social entre cidadãos brancos e negros existente no país” (CARVALHO. LIMA, 2012, p. 10), inspiradas no movimento pelos direitos civis dos Estados Unidos. Particularmente a partir dessa época, muitas ações positivas surgiram e tem surgido para a valorização da cultura e da história do negro como essencial para a formação da cultura brasileira. 
As mais recentes dessas ações formais deram-se com as leis 10.639 e a 11.645, que têm por fim último a promoção formal e obrigatória dos estudos culturais negros e afro-brasileiros nas escolas de todo o Brasil. De fato, não será, porém, uma ou duas leis que se responsabilizarão para que o que se propõe seja cumprido, mas sua aplicação efetiva, que só será possível se houver profissionais comprometidos e conscientes da importância e do reconhecimento do estudo e da valorização de todos os saberes que compõem a cultura brasileira, particularmente, daqueles que, literalmente, construíram este país com mãos de ferro e costas marcadas. 
Os professores neste processo não são os culpados pela disseminação de inverdades sobre os negros e negras escravizados e violentados, e, por muitas vezes, reproduzirem discursos (pré) conceituosos. Mas, fazendo jus ao seu ofício de ensinar e, muitas vezes, de educar, precisam atentar-se às artimanhas da língua, que por si é ideológica, para que não sejam também os responsáveis pela propagação do ódio, do racismo e da separação entre as pessoas dentro do próprio país e no mundo, pois como disse a mãe da menina do lápis de cor, em sua simplicidade: “papai do céu fez as pessoas assim para que elas pudessem entender que são as diferenças que tornam cada ser especial”. 


Referências

AMOSSY, Ruth (Org.). Imagens de si no discurso: a construção do ethos. São Paulo: Contexto, 2005.

CARVALHO, Francione Oliveira. LIMA, Dulcilei da Conceição. Relações étnico-raciais: a presença negra no Brasil. São Paulo: Editora Mundo Mirim, 2012.

CELANI, Maria Antonieta Alba. Questões de ética na pesquisa em Linguística Aplicada. In: Linguagem & Ensino. Vol. 8, n. 1. Pelotas, 2005.

MARTINS, Silvana. A menina e o lápis de cor. In: Cadernos Negros – Contos afro-brasileiros. Vol. 38. São Paulo: Quilombhoje, 2015.

MUNANGA, Kabengele. Algumas considerações sobre “raça”, ação afirmativa e identidade negra no Brasil: fundamentos antropológicos. In: Revista USP. N. 68. SP: USP, 2005-2006.

SANTOS, Arnaldo. A menina Vitória. In: SANTILLI, Maria Aparecida. Estórias africanas: História e Antologia. São Paulo: Ática, 1985.

ZAU, Filipe. Definição de Assimilados. In: Jornal de Angola. 26 de abril de 2015. Disponível em: http://jornaldeangola.sapo.ao/opiniao/artigos/definicao_dos_assimiladosAcesso em: 2 de agosto de 2018.


Professor de Literatura Portuguesa da Universidade Estadual de Montes Claros - UNIMONTES, membro do grupo permanente do PPGL - Estudos Literários, atual Coordenador Institucional PIBID-Capes. Em 2017 concluiu o primeiro Pós-doutorado em Estudos da Linguagem pela PUC-SP e, em 2019, concluiu o segundo pós-doutoramento em Estudos Literários pela UNIMONTES. Doutor e Mestre em Literatura Portuguesa pela Universidade de São Paulo - USP. Possui Especialização em Teologia pela PUC-SP e em Língua Inglesa pela Universidade Estadual Paulista - UNESP. Atuou como professor universitário em diversas IES do Estado de São Paulo. Trabalhou com formação de professores na Secretaria de Educação do Estado de São Paulo durante cinco anos. Também foi um dos responsáveis pela implantação do projeto Early Bird, ensino de Inglês nas séries iniciais, junto a mesma Secretaria de Educação. Recebeu o Título de Professor Paulista, na Câmara dos Vereadores de São Paulo, em 2017. Tem experiência na área de Letras, com ênfase em Literaturas de Língua Portuguesa, Ensino e Estudos da Linguagem, atuando, principalmente, com: Literaturas de Língua Portuguesa, Literatura Comparada, Teoria Literária; Eça de Queirós, Teolinda Gersão, Florbela Espanca (Currículo Lattes). 

terça-feira, 6 de novembro de 2018

Bailarina

Olhos nos olhos me prendem
Quero voar no teu olhar, me entende...
Quero dançar como a bailarina:
pés machucados da caminhada, 
corpo leve das conquistas...
Me dê a mão, às vezes me desequilibro... 

Danço enquanto uma plateia me atira
qualquer coisa que possa me ferir
E quase ninguém que dança comigo
me entrega rosas sem espinhos...
Eu não chamei ninguém para assistir,
chamei você para dançar...
Mas eu entendo: é poético ver a bailarina
sangrando e girando... Respingos...
Tento continuar...

Tantos passos ainda novos
e os velhos que não domino...
Eu danço só... Me dê a mão... Desequilibro...
Vem um vento forte, me empurra...
Voou... Vou...
O vento para... Caio... A chuva me molha...
Os passos escorregam, as roupas pesam, me desvisto...
E me revisto de mim... Danço...
Até que um dia esse espírito me deixe...
Não serei eu, não precisará me dar a mão...
Espírito que voa com o corpo ao chão
Olha que linda, a bailarina na caixinha...
Não sou eu.

Vanuza Alves

terça-feira, 9 de outubro de 2018

Metamorfose


Eu sou uma mistura de personalidades, personalidades que encontrei ao longo de minha vida e que moldaram meu eu, ocultando de mim mesmo o meu verdadeiro ser. Assim, sucessivamente, eu vou moldando outras personalidades com o que se formou em mim, querendo ou não.
A música inspira e de certa forma modifica e faz o seu eu agir de acordo com o sentimento ali representado, elevando-o acima de sua condição. Com sua beleza ela se torna a trilha sonora da vida de muitos, fazendo o indivíduo sentir com sua melodia e raciocinar com sua letra, entrando em um estado de reflexão ou impulso constante, sem ao menos perceber: tudo ocorre no subconsciente, onde há nossos pensamentos mais profundos, quase que de encontro com o espírito.
A compreensão é inútil para quem não tentar compreendê-la. Tudo é muito mais do que imaginamos. Devemos sempre pensar em consequências, fatos e sentimentos. Somos seres simples, mas que aos olhos de quem não pensa parecemos tão complexos quanto qualquer coisa que ache complicada. Como muitos sofrem para ser feliz, quando a única coisa necessária é querer...

Henrique Silva

quarta-feira, 4 de julho de 2018

A educação admirada

Hoje eu vi uma linda cena
Essa me arrancou sorrisos
Um senhor muito educado desceu do ônibus
Desejou bom dia a todos
Tirou o chapéu e ao motorista agradeceu
Uma cena tão inocente
Ao mesmo tempo inusitada e diferente
Me fez pensar em como tudo era antigamente
O ser humano era mais valorizado
A educação não era algo raro
Desde cedo o jovem aprendia
Como tratar e respeitar a todos com maestria
Me questiono onde tudo mudou
O que fez tudo chegar, onde chegou
Jovens não valorizam os mais velhos
Respeito e educação são coisas do outro século

Veronica Silveira

segunda-feira, 18 de junho de 2018

Duas rosas e uma lua

Fotografia sobre a primeira noite de 2018 - Arquivo pessoal

De todas as paisagens possíveis para se admirar
Eu me perco neste Céu, nas estrelas e no luar.
É tão misterioso a forma como ele ilumina.
É algo inspirador, motivador, que me anima.


Uma Lua, suas fases,
Consegue estar ao mesmo tempo em vários lugares.
A lua cheia é a mais admirada
Imagina a olhar por uma longa estrada?


Sobre o dia, a natureza, também irei citar.
As rosas para mim, tem um símbolo particular.
Para cada cor de rosa um significado,
Como presente é uma demonstração de ser amado.


Duas rosas e um luar,
entendam aonde quero chegar.
Não é sobre olhar para o céu e encontrar essa imagem.
É sobre ter na memória como bagagem...


Várias luas, várias rosas, várias histórias.
Um livro de lembranças.
É sobre poder refletir sobre suas andanças.
Outro ano se inicia e melhor você pode ser
Só basta você então querer.

Veronica Silveira

sábado, 2 de junho de 2018

Jesus Cristo e Marielle

O evangelho deste domingo (Mc 2, 23-3,6), tem um “versículo discreto” que diz muito a respeito de que tipo de humanidade Cristo sempre pretendeu na sua missão de fazer acontecer o Reino de Deus. Antes de curar certo homem da mão seca (cf. Mc 3, 1), Jesus coloca-o no meio, no centro: “Levanta-te e fica aqui no meio! ” (Mc 3, 3). É isso que Cristo quer dos seus seguidores, que sejam capazes de trazer para o meio quem tem necessidade de cuidados, de atenção. 
Ao lembrar disso, recordo Marielle, morta dia 14 de março deste ano e que hoje completa-se 80 dias de não resolução de seu caso. Seu histórico, suas lutas, sua causa e convicções traduzem e nos dão noção dessa mesma atitude de Jesus, de colocar a humanidade sofredora no centro de todo o cuidado. Sim! Ela defendia os prediletos de Jesus. Ela estava no mesmo lado de Jesus. Não neguemos!
As semelhanças das atitudes de Marielle com as muitas de Jesus, se dá também no fim de suas vidas. A vida dessa “mulher ousada”, foi ceifada por uma submetralhadora HK MP5 e ancorada em uma não resolução do caso. Quem manda querer se preocupar tal e qual a Jesus, mulher? Quem mandou se preocupar com os que ocupam as margens de nosso país? Quem mandou trazer os homens e as mulheres para o meio? 
Jesus, depois de restabelecer tantas outras vidas, foi morto. Não com uma submetralhadora, mas condenado numa cruz. Em dias como nosso, quem se detêm seriamente em trazer quem está a margem para o centro, não tem tempo para perceber os que tramam sua morte e defender-se a si próprio. Se entrega tanto ao outro, que esquece de si. “Ao saírem, os fariseus com os partidários de Herodes imediatamente tramaram, contra Jesus, a maneira como haveriam de matá-lo” (Mc 3, 6). 
Cristificar-se até a doação da própria vida.

Frei Leandro Costa, OFM

domingo, 1 de abril de 2018

Verbetes de um dicionário sartreano

Vida (vi.da) s.f. 1. Conjunto de improvisos. 2. Sucessão inevitável de decisões e responsabilidades das quais não se pode abster-se // Jaula da liberdade. 

Ana Beatriz Belo Guimarães